quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Ela deve ser punida

Hoje cheguei na escola e fiquei sabendo que "S" , uma aluna com dificuldades especiais, havia sofrido bullyng.  Os colegas bateram nela, xingaram-na e , não satisfeitos, rumaram-lhe na cara uma fivela de ferro.
"S" é uma garota negra, pobre, com carências na alimentação, no vestuário, na moradia, no acompanhamento da família... com carências de todas ou quase todas aquelas garantias que a Constituição Federal e o ECA lhe asseguram:

                É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Art. 227 da Constituição Federal Brasileira.

Os colegas a chamam de "dragão", do cabelo "ruim" e outras coisas desagradáveis mais.

Aí, outro dia ela xingou a diretora.  Xingou, mas xingou mesmo.  Mandaram-na para casa.  Deram-lhe uma suspensão.  Fiquei sabendo que quando acontece isso, ela é espancada em casa.  Pela avó primeiro e depois pelo avô. 

Resolvi então que irei até sua residência.  Quero falar com essas pessoas, dizer-lhes que gosto muito da garota.

Conversei com uma colega, companheira de muitos anos na luta pela educação, que de pronto aceitou a proposta.  Fui então falar com uma das psicopedagogas, relatei-lhe os ocorridos e pedí-lhe que também ela fosse em visita, pois quanto mais gente os avós verem chegar mais vão saber que os maustratos  tem que parar.

Mas qual não foi minha surpresa, quando ela me respondeu:

- Ela deve ser punida (na minha opinião) de alguma forma ela deve ser punida. 

E lá se foi ela no seu salto, nos seus panos e no seu belo carro.

Essa indiferença, esse olhar o outro numa relação patrão  versus empregado , senhor  versus escravo, superior versus inferior é uma ofensa à dignidade da pessoa humana., o princípio mais caro da\ Carta Magna.  Ele pauta nossas relações em sociedade, perpassa o nosso conviver com o outro, dita nossas transigências  com pessoas cidadãs.

Não acredito que a garota deva ser punida .  Não acredito em punição, ainda mais em se tratando de pessoas que tenham distúrbios ou transtornos.   Essa política de punição me cheira ao ranço da herança paternalista e machista dos coronéis do cacau, que ainda não saiu da cabeça de muita gente por aqui, mesmo daqueles com diplomas na área da Psicologia e da Psicopedagogia.


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